terça-feira, 26 de outubro de 2010

Crime Ferpeito

Dias atrás assisti um filme que, a princípio, não dei muita bola. Bom… A não ser pelo nome: Crime Ferpeito. Comédia que comecei a assistir para confirmar o suposto erro de grafia, mas que não tardou a me prender até os créditos finais desta engraçada co-produção Espanha/Itália.

Na primeira cena, um cenário branco e duas portas ladeadas, porém distantes entre si. No meio, uma arara de roupas repleta de ternos. De repente, duas pessoas adentram o cenário minimalista: cliente e vendedor. Este, numa tentativa patética de vender a todo custo um produto único que o cliente não deseja; aquele, blasé e mal educado, não só tentando se desvencilhar do assédio, como aproveitando a deixa para gerar um imenso desconforto em nosso incauto vendedor. Sejamos sinceros, o objetivo maior de oito entre dez treinamentos de vendas -sim, era disto que tratava a cena: treinar, mas não sem antes constranger quem aceitou (ou foi obrigado a) participar da dinâmica, não raro, capitaneada por um orientador fascista. Sem dúvida, um mote interessante para uma boa comédia de humor negro.

O filme

Rafael (Guillermo Toledo) é um vendedor nato. Elegante, bom-papo, auto-estima jorrando dos poros, cercado de bajuladores por todos os lados. Supostamente detesta o lugar comum, a falta de metas na vida e a mediocridade. Porém, vejam só, seu objetivo de vida é tornar-se gerente de departamento da loja onde nasceu -sim, nasceu- e praticamente reside -já que não raras vezes tem suas noites tomadas por uma espécie de fantasia luxuosa e luxuriante com suas vendedoras, regada a champagne, jantar elegante, roupas caras e alcova indevidamente apropriados; situação acobertada, é claro, pelo segurança a quem paga um cala-boca e o tem como fã.

   

Mas quando tudo ia bem na corrida pela gerência, uma decepção. Nosso Don Juan acaba perdendo a disputa para o seu arquirrival, Don Antonio (Luiz Varela); este, funcionário antigo, metódico, nada elegante, porém outro líder em vendas e, por isto mesmo, candidato junto a ele ao posto de gerente. Após uma venda frustrada pelo retorno de um cheque graúdo -venda firmada com o supra-sumo do galanteio barato nos últimos minutos do fechamento do caixa-, o posto que até então já estava definido, muda de dono. Logo na sequência, ao destratar a cliente na hora da devolução da mercadoria, vencedor e derrotado se engalfinham numa briga de bastidores que, acidentalmente, acaba pior para o recém empossado gerente. Resultado: de um lado, morte; do outro, pânico -obviamente.

E agora? O que fazer com o corpo? Será que alguém viu o que aconteceu? Sim, Lourdes (Mónica Cervera), a mais feia de todas -a única delas, por sinal; que a partir daí passa a ajudá-lo, guarda segredo, mas cobra caro pelo favor: primeiro como amante; depois como marido e depois, pior, como escravo de seus caprichos -os quais mudam drasticamente não só a vida do protagonista e do próprio dia-a-dia na empresa, como também faz retornar do limbo seu recém embarcado rival para, até ele, tentar convencê-lo a tomar uma atitude mais drástica contra a megera. Em suma, uma crítica bem humorada acerca do consumismo, da questão das aparências e, para quem é do ramo, dos bastidores da vida entre balcões. Ótima opção para um sábado a noite frustrado ou para um domingo no horário do Fantástico. Se é que vocês ainda assistem.

Até a próxima!

[ChuckWilsonDB]

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Crime Ferpeito (El Crimen Ferpecto, Espanha/Itália, comédia, 98min, 2004). Diretor: Álex de la Iglesia. Elenco: Guillermo Toledo, Monica Cervera, Luis Varela, Tejada Enrique Villen, Fernando Tejero, Kira Miro.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Quinteto Metais do Paraná apresenta Rex Richardson

No domingo último, dia de pleito, enquanto muitos se dirigiam às urnas, como era de se esperar, outros (nem tão poucos assim), tomavam um rumo diferente, um pouco mais longo, porém, certamente, mais agradável. E isto, não porque a política em si seja algo sem maiores atrativos -mesmo (ou principalmente) no Brasil-, mas simplesmente porque acordar, mesmo que num domingo atípico de primavera, digamos, outonal, e poder assistir a um grupo de câmara numa formação que lhe é familiar -e melhor ainda, não dispendendo centavo-, é realmente muito mais interessante. Este, aliás, é o caso do projeto Osuel Câmara que, no segundo concerto da temporada, trouxe ao palco do Teatro Ouro Verde, o Quinteto Metais do Paraná e, em sua primeira passagem pelo Brasil, o trompetista norte-americano Rex Richardson.

 

Quinteto Metais do Paraná e o trompetista norte-americano Rex Richardson em sua primeira passagem pelo Brasil. O trompetista é artista residente do London’s Trinity College of Music (UK), professor de trompete e jazz na Virginia Commonwealth University (EUA) e também pertencente ao ról de artistas da Yamaha. (Fotos: Divulgação)

Rex Richardson

Considerado personalidade do ano pela The Brass Herald, revista especializada no gênero, e transitando com facilidade entre a música camerística e o improviso do jazz, Richardson já tocou com grandes nomes do soul e do jazz norte-americanos como Benny Carter, Ray Charles, Dave Holland e Aretha Franklin. Além disto, já excursionou como integrante do quinteto do lendário Joe Henderson, falecido em 2001, e do Chicago Jazz Ensemble, de William Russo. Pela primeira vez no Brasil, o trompetista se apresentou em Londrina e participou da terceira edição do Encontro Internacional de Trompetistas, evento realizado na cidade de Tatuí, em São Paulo, com a organização da ABT (Associação Brasileira de Trompetistas).

Quinteto Metais do Paraná

Formado por Cícero Cordão (trompete), Arthur Fernandes (trompete), Gilberto de Queiroz (trombone) Marcelo das Virgens (trompa) e Guilherme Efron (trombone baixo), o quinteto foi criado em 1993, ano em que Cícero passou a integrar a OSUEL (Orquestra Sinfônica da Universidade Estadual de Londrina), onde hoje atua como primeiro trompetista. Deste então, o quinteto, que já dividiu o palco com importantes nomes como Charles Schlueter, ex-primeiro trompetista da Boston Symphony Orchestra (EUA), Frederick Mills, ex-integrante do The Canadian Brass falecido em 1996, e Nailson Simões, ex-membro do Quinteto Brassil de Metais, vem desenvolvendo um trabalho que transita do erudito ao popular, valorizando, principalmente, o repertório original voltado para esse tipo de formação, além de projetos de cunho didático. Apesar de tratar-se de um quinteto, não é incomum vê-lo com seis membros em sua formação. No caso, o coringa atende pelo nome de Vitor Gorni, talentoso baterista que, infelizmente, não se fez presente na ocasião.

Da esquerda para a direita: Arthur Fernandes (trompete), Marcelo das Virgens (trompa), Gilberto de Queiroz (trombone), Guilherme Efron (trombone baixo), Vitor Gorni (bateria) e Cícero Cordão (trompete). (Foto: Divulgação)

Concerto

Como disse há pouco, nem o domingo eleitoral, nublado e friorento, foi capaz de impedir que uma parte significativa dos assentos do teatro fossem preenchidos, fato que chamou a atenção, inclusive, do próprio quinteto. Londrina, aliás, possui tradição nesse tipo de espetáculo, matinal e domingueiro, principalmente, por conta do saudoso Concertos Matinais, projeto idealizado pela professora Magali Kleber que além de dar palco a músicos londrinenses e de outras regiões do país sempre nas manhãs de domingo, dedicava-se a práticas de caráter educativo e de formação de público, assim como o próprio quinteto tem se dedicado.

Programa

O programa deste concerto foi dividido em duas partes: a primeira, erudita, e a segunda, popular. Na primeira, foram executadas obras do norte-americano Eric Ewazen, professor-doutor da reputada Juilliard School em Nova Iorque (EUA), do franco-suíço Arthur Honneger, do austríaco Joseph Haydn, um dos principais compositores do período clássico, provedor das bases para o classicismo de Mozart, Beethoven e Schubert, e, finalmente, do italiano Giuseppe Tartini, compositor barroco e maior violinista do século XVIII. Na segunda, o erudito deu lugar a bossa nova de Tom Jobim e ao jazz de Benny Golson e Duke Ellington. Tanto a primeira como a segunda parte do concerto, foram especialmente arranjadas para quinteto de metais. Quatro delas, aliás, apresentadas na sequência:

Intrada, de Artur Honegger (1892-1955) | (Vídeo: CWDB)

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Concerto em Eb para trompete (Allegro; 1º Mov.), de Joseph Haydn (1732-1809) | (Vídeo: CWDB)

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Programa completo:

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Eric EWAZEN (1954 –) Frost Fire

Bright and fast | Gentle and mysterious | Tense and dramatic

Arthur HONNEGER (1892-1955) Intrada

Joseph HAYDN (1732-1809) Concerto em Eb para trompete [arr. Fred Mills]

Allegro | Andante | Allegro

Giuseppe TARTINI (1692-1770) Concerto para trompete picollo [arr. Fred Mills]

Allegro | Andante | Allegro

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Antônio Carlos Jobim (1927-1994) Bossa Nova [arr. Maestro Duda]

Garota de Ipanema | Wave

Benny Golson (1929 –) I remember Clifford [arr. Gilberto de Queiroz]

Duke Ellington (1899-1974) I Let a Song [arr. Gilberto de Queiroz]

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Concerto em Eb para trompete (Allegro; 3º Mov.), de Joseph Haydn (1732-1809) | (Vídeo: CWDB)

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A filmagem do bis, infelizmente, não ficou legal. A minha tentativa de usar o zoom da maquineta, aliada ao braço já moído pela posição incômoda, frustraram totalmente minhas expectativas antes mesmo do final da música. Também não me perguntem qual o seu nome, pois eu não sei. Entretanto, assim que souber, eu o disponibilizo nos comentários. (Vídeo: CWDB)

Público

Apesar de já possuírmos um público relativamente bem formado, como dito há pouco, percebi que a despeito da qualidade do concerto e dos instrumentistas, do acerto na escolha do programa e também da explicação carismática das obras executadas, fiquei com a impressão de que o público londrinense -ao menos, o presente na ocasião- ainda não está plenamente habituado ao tipo de formação. Digo isto, pois não notei o devido entusiasmo em alguns ótimos momentos da apresentação e também percebi que algumas pessoas deixaram a sala antes da hora. Entretanto, como até mesmo os integrantes do quinteto o fizeram, também me alegrei com a presença acima do esperado para um dia como aquele, de eleições, e como foi bem dito na ocasião, se no próximo concerto cada um dos presentes conseguir levar ao menos um convidado, já quase lotaríamos a parte inferior do Ouro Verde -que, diga-se de passagem, não é pequena. Mas é isso…

Vida longa ao projeto. Vida longa ao quinteto.

Até a próxima!

[ChuckWilsonDB]